segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Devolva-me

Demorei quase duas décadas para empilhar encartes e equilibrar caixinhas em estantes de madeira, de plástico e de madeira. Deixei empoeirá-las até me sentir seguro para viver com alguém.

Arrumei sacolas roxas, de feira ou de pano, grandes e pequenas, escoradas no ombro, nas costas e no chão de trens e metrô. Perdi algum fôlego enquanto o taxista não me ajudava

Pude guardá-los num canto onde pudesse ver e depois ouvir — de preferência quando alguém mais não estivesse ali.

Ela se foi.

Eu invadi o quarto e roubei o conteúdo de um daqueles envelopes.

Trouxe dois amigos para ouvir. Pulei, eram nove da manhã.

A chuva ainda caía, mas não sentia vontade de deitar e deixar o sono vir.

Vi a noite chegar e quem eu esperava não aparecer.

A madrugada surgia, invadia. E o sol do outro dia brilhava enquanto a outra não vem.

A história repetiu. Mais uma, mais duas, mais três.

Arrumei outras sacolas e deixei parte das velhas empoeirar no quarto.

E ela se foi.

E as caixinhas empilhadas agora morrem na vida de outrém.